Não podia ser melhor contado... Grandes relatos... muito bom Carlos!!!
depois da tempestade vem a bonança
Etapa 12 – Sever do Vouga – Felgueira (27,8km, 1140D+, 625D-)
Onde é que a gente ia? Ahhh ..
“Acordei uns 15 ou 20minutos depois novamente a tremer como varas verdes … tinha uma mensagem do pessoal a dizer que estavam na padaria … ao sair do carro doía-me tudo, virilhas, pés, pernas e não conseguia para de tremer … entrei na padaria, dirigi-me ao pessoal e disse “eu fico por aqui, desisto….””
Oh páh … eu dava tudo para ter um registo das caras dos meus amigos de aventura neste momento … ali estavam aquelas almas penadas, piores que um chapéu de um trolha, tão destruídos como eu e vem um caralho como eu dizer “eu desisto” … não houve uma palavra sobre a minha vontade em desistir … o Lima levantou-se e disse-me “senta aí” e foi-me buscar um café quente e uma sande de queijo … o Domingos embrulhou-me na sua manta térmica … o Lobo olhava para mim e pensava “what the fuck???” …
… senti vergonha, confesso … estava a escolher o caminho mais fácil … tudo isto se passou num minuto, o tempo suficiente para eu juntar os remendos em que estavam o meu corpo e a minha alma e dizer para mim mesmo … desistes o caralho!!! Agora vais com eles até ao fim …
txiii .. como te puseste rapaz
O cafezinho, o pãozinho com queijo mas ainda mais o “mimo” aqueceram a alma e o corpo. Já não tremia .. estava destruído mas não tremia. Tomo decisões rápidas mas que foram as mais acertadas … mudei de meias e calcei as sapatilhas de estrada, mais confortáveis, menos estáveis. O suficiente para me sentir melhor dos pés que já apresentavam as primeiras bolhas, mas muito longe do habitual. Enchi os flasks e preparei tudo para uma etapa longa até Felgueira. Vamos caralho …
tem que ser ...
oupas
tou lixado para os aturar
nunca mais uso meias de compressão
tenho que ter uma paciência
O tempo continuava instável, mais aberto mas ainda apanhamos alguma chuva na primeira meia hora. Depois abriu totalmente e tivemos sol o resto do dia.
Demoramos uns bons 20min a entrar no ritmo, depois os pés e as pernas voltaram a estar em condições … incrível .. como num momento estás que nem um passo consegues dar sem teres dores em todo o lado, e a seguir estás a correr a um ritmo razoável ou a subir rampas em caminhada forte sem grandes problemas. E querias tu desistir, morcão!!!
Esta etapa embora dura pelo desnível positivo que tinha não nos custou muito … os km fluíam bem. A Dora ligou a dizer que havia um restaurante em Felgueira e que fechava a cozinha às 14h … estava a tentar convencer o dono a guardar 6 sopas pois não sabia se chegaríamos a tempo. Pelos vistos não lhe resistiram ao charme, e as sopas pelo menos estariam garantidas. Mesmo assim o objectivo passou a ser chegar a Felgueira antes das 14h.
O Domingos e o Lobo arrancaram mais fortes ainda com 10km feitos … queriam tentar dormir um pouco em Felgueira. O Leandro voltava a acusar desgaste, especialmente quando subia muito (falta de treino com desnível … da próxima não falha 😉) e só dizia “raio dos velhotes” 😊 …. Eu e o Lima fomos ficando com ele, sempre um pouco mais à frente para não o deixar “amalandrar muito”.
E assim fizemos todo o percurso … quando faltavam 3 ou 4 km tb eu e o Lima arrancamos e chegamos uns bons 20min antes das 14h … o Leandro viria ter ao Restaurante.
sexy mother focas
O restaurante é Top … e estava cheio de gente bem cheirosa para o almoço em família, tb havia um grupo grande de motoqueiros … e nós todos suados e sujos …csafoda … venha mas é a sopinha e algo mais … topem o repasto … que maravilha.
Agora vinha uma etapa mais curta até ao Merujal … iriamos subir a Freita por um lado e descer pelo outro num percurso que me parecia acessível e bonito.
Etapa 13 – Felgueira-Merujal (12,8km, 415D+, 650D-)
Mas depois do almoço deu aquela moleza e o soninho voltou. Juntou-se a nós a Teresa, esposa do Domingos para acompanhar nesta etapa.
Houve divisão do grupo para esta etapa. O Domingos seguiu com a Teresa. Eu, o Lobo e o Leandro (que voltava a estar branco e maldisposto) decidimos dormir uma sesta de 30min. O Lima decidiu seguir sozinho e esperar no Merujal por nós.
Mesmo com uma barulheira do caraças dos gajos do café, das motas do motoqueiros dormi que nem um bebé deitado num pedaço de relva em frente ao restaurante. O Lobo e o Leandro tb, assim como um canito que deve ter achado piada aos novos companheiros de sesta 😉 … quem tb fez a sesta foi a Dora, mas no carro. Isto de acompanhar uma coisa destas não é nada fácil.
lol
Exactamente 30min depois toca o meu despertador … acordar o Lobo, preparar a coisa e siga. O Leandro tinha decidido ficar mais um pouco, a ideia era fazer mais esta etapa e a Flávia o vir buscar.Esta etapa foi muito tranquila … fui o tempo todo na letra com o Lobo … depois da grande subida, corremos uns poucos km um pouco acima dos 5min/km … incrível, depois de 250km nas pernas, e depois de termos passado pelo que passamos.
A meio recebo uma chamada do Leandro um pouco aflito …
L - “Carlos, está aqui um Boi no meio do trilho”
C – “txiii … está a olhar fixamente para ti?” a rir-me por dentro, pois era um vaca, daquelas típicas e inofensivas que andam a pastar soltas por toda a Freita, e sabia exactamente qual era pois tínhamos passado por ela no trilho há uns minutos atrás … até falei para ela e de facto ela olhou-nos fixamente..
L – “sim, está!
C- “tás fodido moço, se puderes foge” …
L- “tás a falar a sério?” … não me contive e escangalhei-me a rir
C- “és mesmo menino da cidade caralhes … é uma vaca páh, e não fazem mal a ninguém … “
Acho que me fui a rir durante uns bons km … Leandro – para a próxima aventura, treino com desnível pelos percursos da Freita, ou do Marão, ou de Montemuro … para treinar as pernocas e te habituares aos animaizinhos das serras 😉
o "touro" era esta menina
Ainda me estava a recompor desta história engraçada e liga-me o Lima … “acho que me perdi, segui o PR7 …” … não acredito, tantos percursos para se enganar e foi escolher logo o PR7, um dos mais difíceis … a sorte é que passa ao Merujal. Este Lima não existe … pior orientação que ele só mesmo o nosso Américo, o GPS humano 😊
mais uma marca importante ...
Chegamos ao Merujal e fomos ao café do Parque de Campismo beber uma Cola gelada (eu) e uma Super Bock (o Lobo). Não havia rede, não conseguia contactar a Dora mas sabia que estaria algures por ali. E estava um pouco mais abaixo, com o Domingos, a Teresa e o Lima tb já tinha chegado.
Toca a preparar para a última etapa … vamos voltar a Arouca.
Etapa 14 – Merujal-Arouca (23km, 600D+, 1205D-)
Teresa & Dora ... equipa de apoio do Merujal
sigaaa ....
23km para acabar esta aventura. Sentia-me mesmo bem e o mesmo sentimento parecia-me transversal aos meus amigos. Apenas o Lima estava com uma corrida um pouco forçada … com um percurso maioritariamente a descer e plano corremos muito … eu tive uma paragem técnica para soltar uns javalis e corri abaixo dos 5min/km para apanhar os meus compinchas … incrível … a este ritmo chegamos antes das 21h.
Mas seria fácil de mais, não acham?
A partir de um terço da distância começamos a entrar naqueles trilhos típicos da Freita, muita pedra que ao início ainda se aguenta bem, mas com o tempo se torna chato e massacrante. É um dos motivos porque não me aventuro muito em provas pela Freita. E foi aqui que o Lima voltou a ter dores fortes nos pés e nas canelas.
Entretanto liga o Luis Teixeira que já tinha chegado a meio da tarde a Arouca – maquinão 😉 … queria saber a que horas prevíamos chegar, queria estar connosco no fim. Aponta para as 22h, talvez um pouco antes.
Nesta longa etapa a tortura tb é psicológica … é que começas a ver Arouca lá no fundo logo por volta dos 5km … mas o percurso leva-te a passar Arouca e a ir “passear” por umas aldeolas (espinho por exemplo) na direcção contrária sem aparente necessidade nenhuma. É que aqui já só vais a pensar em chegar.
Várias vezes passas por cruzamentos com estradas em que tens placas a dizer “Arouca” enquanto o percurso segue em sentido contrário. O Lima várias vezes, no desespero, disse para irmos directos a Arouca, que já chegava, que tínhamos km a mais, bem acima dos 275km que a rota indicava. Mas eu não deixei …
A tentação foi grande, mas é para fazer a rota … bem me custou insistir, por ele, confesso. O Lima ficou lixado, bem notei … mas foi. Entretanto escureceu, tivemos que voltar a colocar os frontais … faltavam 6km e o Domingos recebe uma chamada … ficou para trás. Pouco depois, como que possuído pelo diabo, passa por nós a grande velocidade a dizer “só paro no carro” … cada um com a sua maluqueira…😉
A minha preocupação era o Lima … ele nestes últimos km mostrou a raça de que é feito … até doía a alma ver aquele gajo a sofrer atrozmente das canelas e dos pés e mesmo assim a tentar correr nos planos e nas descidas para despachar a coisa e não nos atrasar mais. Várias vezes nos disse para irmos andando. mas isso, como é lógico, estava fora de questão.
O Lobo ia abrindo caminho, o Lima no meio e eu fechava a comboio … houve momentos em que só me apetecia pegar no velhinho ao colo e carrega-lo até à meta .. mas o gajo é grande e pesado, e careca 😉.
Tentava distrai-lo com conversa de chacha mas não funcionava… houve uma altura em que ia atrás dele e só o ouvia a gemer a cada passo de corrida em que fiquei com os olhos húmidos … deve ter sido algum mosquito que me entrou no olho … fonix .. que herói … ir ali, com umas pernas pesadas mas ainda na boa era para meninos .. ir ali no estado em que ele ia já não é para qualquer um … grande Lima, é o maior.
Finalmente Arouca … ligo à Dora a dizer que vamos chegar pela Camara Municipal e descer a avenida principal … ela diz que vem ao nosso encontro …Fazemos o último km a caminhar … a curtir a chegada … o Lima já se ri, já diz piadas, as emoções estão à flor da pele …tá feitinho e muito bem feito. A Dora filma o momento …
Reencontramos o Domingos, seguimos para junto dos carros, e entretanto chega o Luis para os abraços e fotos finais.
a Dora faz parte desta aventura ...
os maiores!!!
Estava na hora de regressar a casa, tomar um banho … ainda comi 2 mistas e 1 malga grande de Nestum antes de me enfiar na minha cama … que maravilha sentir o conforto da nossa cama ao fim destes dias … adormeci rapidamente com aquele sentimento bom, orgulhoso do feito, feliz pelo que tive oportunidade de viver nestas quase 70 horas de aventura.
Haverá mais um post para fechar esta aventura, faltam os agradecimentos, faltam algumas conclusões, … quem sabe amanhã!!!