Era uma perda de tempo estar a escrever uma crónica sobre o evento... já há quem o esteja a fazer. Podes continuar Carlos!!!
Obrigado 😁😁
GR60 - Aventura pelas Montanhas Mágicas - dia 1
Que viagem extraordinária é fazer a Gr60... Já passou mais de uma semana desde que a concluímos é já tenho saudades. Chegou a hora de tentar registar o que vivi... arrisco dizer que os meus companheiros de viagem terão vivido o mesmo, talvez com um ou outro pormenor diferente... vou dividir isto em 3 artigos, um por cada dia de viagem... coloquem os cintos, vamos descolar...
O arranque da aventura estava previsto para as 00h01 de 5a feira, dia 13. Tinha previsto meter um dia de férias no dia 12, para preparar toda a logística e tentar descansar durante o dia. Não foi possível... ando com muito trabalho... decidi primeiro sair a seguir ao almoço e depois às 15h com o intuito de ainda fazer uma sesta. Estava eu mesmo a chegar a casa e toca o tlm.... tive que voltar ao trabalho para tratar de um assunto do meu interesse... Quando finalmente cheguei a casa ainda consegui fechar os olhos durante meia horita... tudo conta 😉
Ás 21h apanhei o Lobo em Espinho, jantamos uma pratada de massa em casa e seguimos para Arouca onde nos encontramos com o resto da malta para um último café. Ambiente descontraído, mas tb com aquela ansiedade típica de inicio de “prova” a pairar no ar.
Ainda antes de arrancar a primeira desistência... o Bruno, que já tinha decidido tentar fazer apenas o primeiro dia, nem arrancou... o Afonso, o mais novo dele estava com uma gastro, era hora de apoiar em casa...
Equipar, últimas fotos da praxe, beijoca na Dora e arrancamos com uns 15min de atraso... sem problema, temos tempo.
Etapa 1 - Arouca - Santo Adrião (14,8km, 725D+, 775D-)
A primeira etapa são apenas 15km mas com desnível significativo. Começa logo a subir a sério à saída de Arouca.... está noite cerrada, ninguém na rua... Os caminhos são iluminados pelas luzes fortes dos nossos frontais de baterias carregadas.... o tilintar das pontas metálicas dos bastões são abafados pela nossa converseta animada. Afinal, tal como os frontais, tb nós estamos de baterias carregadas.
Vamos subir à Senhora da Mó o que me trouxe recordações do trail com o mesmo nome que ali se realizava há uns anitos quando estas corridas ainda não estavam na moda e se chamavam corridas de montanha. Foram 2 as minhas participações nestacorrida, curta e muito dura.
O ritmo que imprimimos era cuidadoso mas vivo. A subir caminhamos e em plano e a descer corríamos tranquilamente. Era a fase de tentar adaptar uns aos outros. Eu sempre disse que o mais difícil desta aventura era gente de níveis tão diferentes encontrarem um ponto de equilíbrio. Havia o acordo de "amigo não empata amigo" para que a coisa pudesse correr bem a todos.
Até ao alto da Capela de Santo Adrião fomos sempre juntos... primeira de 14 etapas concluída. Siga para Castelo de Paiva.
Etapa 2 - Santo Adrião - Castelo de Paiva (24,6km, 690D+, 1095D-)
A primeira metade desta etapa foi muito idêntica à anterior. Continuava noite cerrada, continuávamos a intercalar um percurso entre trilhos, estradões em terra batida, a passar por pequenas aldeias onde provocávamos sempre um festival de cães a ladrar.
O Luís e o Domingos tinham avançado num ritmo mais alto, eu, o Lobo, o Lima e o Leandro mantivemos o ritmo com que vínhamos. Há que gerir desde o início.
A ideia de arrancar à meia-noite foi por causa do muito calor que se esperava para meados de Julho. A ideia era aproveitar a noite fresca para avançar o máximo possível, gerindo o dia conforme o calor. Esta decisão acarretava ter que fazer 3 noites completas...
Nesta etapa tive um problema com o frontal... não devia estar completamente carregado e como ia na potência máxima durou apenas 3h, baixando para uma luz mínima durante o resto da noite. Isto obrigou-me a uma concentração maior e a aproveitar a luz dos meus compinchas.
As minhas pernas já sentiam os km... nada que me preocupasse... já tenho alguma experiência nestas andanças e sei que é normal.
A poucos km de Castelo de Paiva nasceu o dia.... é sempre maravilhoso, é sempre um momento especial... finalmente conseguíamos ver por onde andávamos.
Até aqui a Gr60 esteve impecavelmente marcada e limpa. O track no relógio ia ligado, mas não foi preciso. Mas mesmo à entrada de Castelo de Paiva demos de caras com o primeiro trilho fechado, com vegetação densa que incluía silvas e urtigas bravas... ainda tentamos abrir caminho à bastonada mas decidimos voltar para trás e fazer parte por estrada.... foi um desvio de 1 ou 2km para voltar ao percurso inicial.
Chegamos a Paiva por volta das 7h... fomos até à uma padaria na praça central para o merecido descanso e tomar o pequeno almoço, e encontramos o Luís e o Domingos que tinham chegado uma meia horita antes.
Café, muito café, Coca Cola, torrada e um doce. Água fresa para encher os flasks todos, uns misturados com carbohidratos, outros com sais, outros com água simples. Foi este o ritual sempre que possível. Mesmo sabendo que a próxima etapa era curta eu não facilitava... Não conhecia o percurso, não tínhamos apoio neste primeiro dia... não se arrisca. Siga até à À CPDFN (Centro de Promoção do Desporto Fluvial e Natureza)
Etapa 3 - Castelo de Paiva – CPDFN (9,4km, 385D+, 370D-)
A etapa mais curta de todas as 14. Não chegava bem a 10km, resumia-se a sair de Castelo de Paiva e entre localidades chegar até ao CPDFN.
O Luís e o Domingos arrancaram mais cedo. Aqui ainda não sabíamos, mas só veríamos o Luis no fim... já o Domingos havíamos de reencontrar uns valentes km mais à frente.
As pernas já pensavam... depois se uma paragem pesam sempre, e precisam de uma boa caminhada para aquecer antes que possamos voltar a correr.
Os meus pés estavam impecáveis.... tenho muito medo de bolhas.... eu sei bem o que costumo sofrer nestas brincadeiras.... estive indeciso na escolha das sapatilhas mesmo até à última.... decidi pelas de Trail e até ali a escolha tinha sido acertada.
Esta etapa foi rápida... poucos km, pouco desnível, e muita estrada.... mas foi muito bonita também pq tivemos em boa parte o Douro como companhia.... e vimos a Ilha dos Amores...
O tempo estava quente mas muito longe do que poderia estar e Julho – em comparação com a PT281 que fiz há 3 anos atrás estava fresquinho 😉. Não passou os 30 graus e em boa parte tivemos sempre uma agradável brisa a ajudar.
Chegamos ao CPDFN que estava fechado.... ainda entrei para ver se havia algum ponto de água mas nada... a pequena aldeia tb não tinha um café.... estão a ver porque não devemos facilitar e levar o que nos for possível, especialmente no que diz respeito a hidratação. Siga até Cinfães....
Esperava-nos uma etapa dura, com algum desnível, com o calor e o sol como adversário extra. Já apetecia uma bebida fresca.... entramos em nova aldeia e perguntamos a uma senhora se havia por ali algum café. Ela disse que sim e indicou-nos o caminho... O problema era que ficava umas poucas centenas de metros fora da rota e ainda por cima a subir.
Mas valeu o esforço.... aquela mini gelada soube pela vida, e só não teve mais uma ou duas como companhia pq o álcool iria fazer mossa. Toca a encher os flasks e siga para enfrentar a primeira subida longa… foram uns 8km sempre a subir, em estradão de terra ou mesmo alcatrão. Sempre a caminhar a bom ritmo e a tentar aproveitar alguma sombra nas bermas.
Foi nesta fase que comecei a notar muito desgaste no Leandro. Começava a ficar para trás e estava um pouco pálido. Esta parte do percurso teve sempre muitos pontos de água, fontes, tanques, bicas... não falhei nenhum para me refrescar.... cara, nuca, braços e pernas... a brisa a bater no corpo molhado.... hmmm, parece que ainda sinto essa maravilha revigorante.
Íamos mantendo contacto com o Luís e o Domingos.... sabíamos que havia um café antes de descer para Cinfães. E sabíamos que havia um tasquinho com pratos do dia e que a senhora do tasco iria esperar por nós. Apetecia uma sopa e comida de faca e garfo. Ficou mesa reservada e comida encomendada pelo Luís e Domingos antes se arrancarem.
Ainda paramos no café para mais uma mini fresca e siga a descer a grande velocidade os últimos 4km até Cinfães onde almoçamos, carregamos os telefones e os relógios e onde a intenção era dormir meia horita antes de partir para a Gralheira.
Ainda nos deitamos pelos cantos dos jardins da cidade mas apesar do muito sono, não consegui dormir. Os outros pelos vistos tb não. Descansou-se à sombra... menos mal. Vamos até à Gralheira?
Etapa 5 - Cinfães – Gralheira (25,2km, 1250D+, 540D-)
Previa-se uma das etapas mais duras, o que se veio a confirmar. Distância e desnível acentuado, em conjugação com o calor que fazia – muito duro.
E começou logo mal... ligou o Domingos, estava com uma voz cansada... avisou que os trilhos para sair de Cinfães eram confusos, que a subida era interminável e com muita vegetação, desprotegida ao sol sem pontos de água … e para termos cuidado com as cobras, que já tinha visto algumas, que eram inofensivas se não se sentissem ameaçadas.
Decidimos entrar no mini preço e reforçar a água... 3,5 ltr devem chegar. Sair de Cinfães foi mesmo muito confuso... falhas nas marcações, trilhos cheios de vegetação sem manutenção nenhuma, mesmo com o track andamos ali às voltas perdidos... valeu a dica do Domingos que nos tinha dito que tínhamos que passar o rio Bestança para o outro lado pela ponte... ajudou a seguir a direção certa.
Os km que fizemos a mais, o tempo perdido, associado ao calor e ao facto de o cansaço já se fazer sentir a sério, fez com que se entrasse a primeira vez no "poço"... quem anda nestas coisas das longas distâncias sabe a que me refiro, sabe que nestas distâncias é uma constante montanha russo de sensações.
No meu caso, era um poço ainda pouco profundo, mas não deixava de ser um poço. Já o Leandro tinha entrado no mais fundo dos poços, sem saber bem o que estava a acontecer... era a primeira experiência dele nestas andanças e estava a fazer a pior das experiências. Foram 18km de subida seguida, não que fosse daquelas muito inclinadas, mas sempre a subir ... subimos uns 1200m... grande parte do terreno era empedrado em trilhos fechados com vegetação alta.
Era fim de tarde, a partir de meio da subida o sol já não escalda tanto. Nem quero imaginar o que o Luís e o Domingos passaram, a subir isto no pico do calor.
Fica na retina um casal de uma casa mesmo à saída da localidade, que nos deu água fresca.... gente boa. Que maravilha.
Recebi uma msg do Domingos a dizer que tinha chegado à Gralheira, que não se sentia bem e que ia desistir. Tentei ligar várias vezes mas nesta zona não há rede. Sabia tb que o Luís tinha decidido alugar um quarto para descansar.
Nesta etapa fica na memória o esforço teimoso e heroico do Leandro para concluir esta etapa. Ficava constantemente para trás e arrastou-se completamente nos últimos 7km até à Gralheira.
Fiz esses km com ele na conversa... sabia que para ele a aventura ia chegar ao fim mas ainda havia um objectivo para se cumprir... os primeiros 100km dele.
Tivemos direito a um engano no percurso por distração, o que nos levou a fazer mais um km extra, mas para compensar tivemos direito tb a um por do sol daqueles magníficos …
… e chegamos à Gralheira já de noite, passava das 22h. Á nossa espera a Flávia e o Pai do Leandro com os nossos sacos com muda de roupa. Tb tinham reservado mesa para jantar e a senhora do restaurante fez-nos uma massa que soube pela vida.
O problema agora era o sono que era muito... o frio da noite inviabilizava estar muito tempo parado, muito menos dormir ao relento .... o Lobo teve a ideia de alugarmos um quarto tb, para dormir umas 3h... nem é tarde nem é cedo… oupas...
Não havia rede pelo que não conseguimos contactar o Luís e o Domingos que estavam a dormir.... soubemos pela Flávia que o Domingos estava melhor e tinha decidido continuar.... deixamos msg a dizer que iríamos sair às 5h e siga dormir.
Um duche rápido para tirar o pó por maior e adormeci logo... foram 3h30 retemperadoras.... quando o despertador tocou estava de tal maneira ferrado que não sabia onde estava.
O Luis é o Domingos tinham arrancado às 3h.
Para o Leandro a aventura tinha acabado ali. Foi com certeza duro tomar essa decisão, mas foi a mais acertada. Como lhe disse, para primeira aventura deste género esteve muitíssimo bem, cumpriu os seus primeiros 3 dígitos e acumulou experiências que lhe vão ser muito úteis no futuro. Estas "brincadeiras" têm uma componente muito grande de experiência, de km nas pernas, e isso aprende-se. Só tem que estar orgulhoso e relembro sempre que nada temos a provar a ninguém.
Querem vir até Castro Daire? Pois terão que esperar … fica para o próximo post. Quem sabe amanhã 😉
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